segunda-feira, 22 de março de 2010

Dentro de mim mora ela, a criança
Que fui e que sou, e a esperança
De que ela um dia em mim prevaleça
Pois, antes que eu me esqueça

Dentro de mim também mora ela, a besta
Horrível que sou e que me faz funesta
Como um segundo eu que me habita
Fazendo da criança a morada maldita

Por onde passa o horror dos meus fantasmas
E que me mostra na sombra os miasmas
A escorrer das minhas cicatrizes
E mesmo em seus momentos mais felizes

Não há como proteger minh'alma pequenina
Do que ela mesma pariu, que é minha sina
Esta besta imensa que a persegue afora
Cobrindo de pavor e sombra sua terna hora

E, se mais em amor minha criança brilha,
Mais em ódio a besta ruge e trilha
Ao seu lado, como contrapeso seu
E me dói saber que ambas sou eu

E se em amor a criança minha resplandece
Igualmente em ódio a besta em mim cresce
Porque não há entre um e outro diferença
Senão na alma de quem faz de um deles sua crença

E não sei se ela, a criança, que já estava em mim
Ficará para sempre viva, ou se no fim
A besta por ela produzida, que me abomina
Calará para sempre minha alma de menina

Por mais que eu pense não encontro um jeito
De desfazer o que em mim já está feito
Se a besta mata a criança, por deus, nem pense...
Se a criança mata a besta, a besta vence!